Um Capricho da Natureza, Nadine Gordimer

Tantos anos depois, comecei a ler "Um Capricho da Natureza" quase por acaso. Estava de férias no Porto Santo e apetecia-me ler, sabe tão bem estar de férias e andar agarrada a um livro.
Perguntei onde era a livraria, mas estava fechada nessa hora e no dia seguinte também não foi possível lá ir, já não sei porquê. Foi assim que acabei comprando um livro na Estação dos Correios. A escolha era pouca e quando dei por mim estava já na rua com este livro na mão. Tem quase 400 páginas (397, para ser mais precisa) e as linhas são demasiado juntas para o meu gosto. Mas está muito bem escrito e foi sem dificuldade que cheguei à parte onde vou agora, na página 176.
"(...) De início ela viu apenas as borboletas, uma profusão de borboletas que faziam vibrar o ar tranquilo e denso. Havia também flores brancas a transbordar de perfume. Hillella mergulhou nelas o rosto, como as borboletas também faziam. A selecção competitiva da natureza - árvores lustrosas e vorazes que tinham matado à fome os arbustos próximos abrindo espaços de ervas e plantas mais pequenas; trepadeiras e lianas devorando as outras árvores que haviam cometido o erro de nascer demasiado perto - dera origem ali a uma espécie de jardim; ou seria talvez efeito de uma recomposição humana da natureza, uma intervenção muito antiga, mas ainda precariamente identificável sob a forma natural da vegetação, como as linhas de uma cidade perdida que se distinguem do alto de um avião em pleno voo.(...)"
Hillela é a personagem principal. Ela é o tal "capricho da natureza", a que se refere o título.
3 Comments:
Olá Lília
De Nadine Gordimer, só li até hoje "O Conservador", mas este pequeno exerto de "Um Capricho da Natureza", aguçou-me a curiosidade para o conhecer.
Abraço
Olá Lilia
Eu também sou um capricho da natureza... vou-me ficar por mim.
Já postaste aqui bocadinhos que me deixaram louca, mas este não me apetece...
Obrigada pela partilha.Continua.
Idalina
Olá a todos,
Ler este livro é um daqueles golpes de sorte, é o que é! (E encontrá-lo numa estação dos correios do Porto Santo, por sinal, é outro - o meu caminho até ele foi bem menos fulgurante; Queria que ele se me tivesse imposto).
Nadine Gordimer, claro, é de ler sempre, mas, neste caso é a oportunidade de acompanhar Hilella por mais de 400 páginas que torna o livro especial – não a escrita inesperadamente densa e sempre inteligente da escritora.
Hilella revela traços atrás de traços de uma sensualidade despretensiosa e sempre vazia de preconceitos, uma avidez curiosa pela vida e pelos outros; Consegue desmontar a dualidade amor/sexo, transformando-a num subtil uníssono de desejo – quase sempre sexual?! Não consigo acabar o livro; Não quero acabar o livro.
Hilella fornece pistas para uma vida mais plena, mas é, ao mesmo tempo, um marcador das páginas de um livro de sofrimento que é preciso ler, página a página, e interrogar.
«Il faut se prêter aux autres et se donner a soi-meme», "Montagne"
É como quem diz: é preciso ser mais como Hilella.
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